Na penumbra do túnel imperial, borbulhas em tempo de maturação

No túnel são feitos a guarda, a maturação e os processos finais do vinho espumante; o Nature e os Brut ficam dois anos na penumbra e em temperatura constante

 

Teria sido um sonho? Uma aparição? Um fato real? Poderia ter sido também a inspiração para um pequeno truque de marketing para ilustrar a história contada aos visitantes?

A questão é que o túnel lá está. É real em toda a sua extensão de 429 metros em rocha de granito, seus cinco metros de altura, três e meio de largura, 955 acima do nível do mar e 170 metros abaixo do sopé da montanha, recheado de garrafas de espumantes em processo de maturação. Fica a 20 quilômetros do pico do Marumbi e a 30 da baía de Antonina.

Ari Portugal, do projeto da pousada a um sonho realizado

Ari Portugal, o empresário, e por longos anos executivo da antiga Bamerindus Seguradora, depois de se aposentar, comprou, em 1999, uma área de 45 hectares situada nos fundos da estação ferroviária de Roça Nova, em Piraquara, cidade da região metropolitana de Curitiba, a 30 quilômetros da Capital. Sua ideia inicial era ali construir uma pousada ecológica.

No ano seguinte, arrematou em leilão da extinta Rede Ferroviária Federal S/A, no qual foi o único a dar lance, a velha estação de trem (construída em 1883), uma litorina sucateada e o túnel ferroviário desativado desde 1969, que teria sido inaugurado pela princesa Isabel, filha do imperador D. Pedro II. Tudo isso se encaixava, ainda, no projeto da pousada, como conta o filho Rafaelle Portugal, que administra o lugar. Quanto ao túnel, ele não ainda não sabia o que fazer.

Pois foi numa das incursões de Ari, já como proprietário, à velha passagem encravada na montanha, que teria surgido, sabe-se lá de onde, um homem que dizia conhecer caves subterrâneas francesas e que o túnel tinha todas as características de temperatura para servir como maturação de vinhos. Ari nunca mais o viu nem ouviu falar dele. Um mistério, em suas palavras. E, em cada visita, ele narra aos grupos essa história.

A antiga estação de Roça Nova foi restaurada e abriga o restaurante e a loja

O lugar, hoje, abriga a Cave Colinas de Pedra, que funciona de quarta-feira a domingo, das 10h às 17h; nos finais de semana e nos feriados é servido almoço gourmet onde, naturalmente, a harmonização é feita com o produto local.

A Cave Colinas de Pedra não tem (ainda) vinhedos e nem produz os espumantes. A primeira fase da elaboração da bebida é feita pela vinícola brasileira Cave Geisse, de Pinto Bandeira, na Serra Gaúcha, propriedade do enólogo chileno Mário Geisse. Seus espumantes são reputados entre os melhores do Brasil. “É uma parceria que nos orgulha”, diz Rafaelle Portugal.

Mas, afinal, como o projeto de uma pousada acabou se transformando na cave?

Enquanto lidava com a burocracia para a obtenção do alvará da pousada, os anos foram passando. E com aquele palpite do homem-aparição ainda martelando na cabeça, Ari Portugal resolveu ousar. E partiu para o negócio de maturação de espumantes. Depois de alguns contatos, chegou à parceria com a Geisse.

Antes, porém, pesquisou muito sobre a matéria, viajou ao exterior, foi adquirindo conhecimentos. Mandou fechar o túnel nas duas extremidades e, durante dois anos, ali foram realizados testes de temperatura e umidade.

O salão do túnel: ao final do percurso, um brinde com espumante

Ao final do período, foi constatado que a temperatura interna do túnel variava apenas 1°C ao longo de todo o ano, sendo 16°C no inverno e, no máximo 17°C, no verão, o que reunia as condições adequadas para a maturação de vinhos espumantes. O projeto da pousada ficou hibernando e um novo começou.

A construção do complexo levou 10 anos, de 2005 a 2015. Ari diz que ninguém o apoiou nem incentivou, mas ele acreditou no sonho.

As duas portas internas, no espaço da cave, são do tipo “cofre forte”, ambas de alta resistência. A capacidade de armazenamento é de 50 mil garrafas, porém existe uma cave reserva, podendo elevar esse número a 500 mil unidades.

ESPUMANTES EM SEIS VERSÕES           

A Cave Colinas de Pedra faz a guarda, maturação e processos finais do vinho espumante, pelo método de elaboração Champenoise, que compreende a rèmuage e dégorgement (processos que vão do giro prévio das garrafas até o congelamento dos sedimentos e sua retirada), adição do licor de expedição, rolha, gaiola e rotulagem. O produto recebeu o nome de Tunnel. Não podia ser diferente.

São seis versões: Nature, Extra Brut, Brut, Brut Rosé, Moscatel e Moscatel Rosé. O Nature – em torno de 80% de uvas Chardonnay e 20% Pinot Noir – não tem adição de açúcar. Tem bolhas pequenas e paladar encorpado, com acidez equilibrada, bastante seco. O Extra Brut e a Brut, com o mesmo corte de uvas, com acidez agradável, diferem ligeiramente no olfato e na quantidade de açúcar adicionada.

O Brut Rosé, 100% Pinor Noir, possui coloração rosada com reflexos alaranjados. No olfato, destacam-se aromas de mel, compota de figo e rosas; acidez equilibrada. Esses quatro ficam no mínimo dois anos maturando na penumbra do ambiente.

O Moscatel possui aroma frutado e floral, característica do varietal. Apresenta coloração amarelo-palha, com reflexos esverdeados e paladar macio e delicado, com equilibrada doçura e acidez. Já o Tunnel Moscatel Rosé, corte das variedades Moscato Branco, Moscato Giallo e Moscato de Hamburgo, oferece uma tonalidade levemente rosada ao espumante, elaborado pelo Método Asti.

PRATOS HARMONIZADOS

A antiga estação de Roça Nova foi aos poucos sendo restaurada seguindo as principais características da época. Hoje, abriga em dois pavimentos, restaurante para até 60 pessoas e loja de venda de espumantes.

A litorina, de peça sucateada a vagão gourmet

No entorno, um belo bosque, com trilhas para caminhadas pela Mata Atlântica, áreas de descanso com poltronas e o Vagão Gourmet – aquela velha litorina sucateada, fabricada nos Estados Unidos nos anos 1960, hoje renovada, inclusive com banheiros, e dedicada a momentos de relax onde são servidos chás, cafés, espumantes e chocolates quentes.

A cozinha fica por conta de dona Rosi Mari Portugal, esposa do fundador Ari. Professora do curso de Engenharia da PUCPR, nos finais de semana e feriados ela cria pratos como camarão na moranga, polenta cremosa, barreado, que harmonizam com os espumantes Tunnel, além de brusquetas, mini saladas e sobremesas; há uma tábua de queijos variados e pães especiais.

Em meio ao bosque, confortáveis ilhas de descanso

Ari Portugal calcula que, nesses dois anos e meio de funcionamento, a Cave já recebeu cerca de 12 mil visitantes. Em grupos de até 15 pessoas, eles são conduzidos até a metade do túnel por uma plataforma elétrica, tipo trenzinho, percurso de 154 metros e de poucos minutos. Dali, seguem entre cavaletes repletos de garrafas em maturação até um salão, onde ouvem novas explicações de Ari e fazem um brinde com taças de Tunnel.

O projeto da pousada continua firme. Um dia saí do papel. E há um outro em maturação: o de possuir os próprios vinhedos. Ari já está de olho em boas terras da Serra Gaúcha ou, quem sabe, da região da Campanha, também nos pampas.

A Cave Colinas de Pedra é uma das oito vinícolas que compõem o Polo do Enoturismo da Grande Curitiba, coordenado pela Vinopar (Associação dos Vitivinicultores do Paraná).

PARA CHEGAR À CAVE

O roteiro para chegar à Cave Colinas de Pedra é o seguinte: a partir das alças do Contorno Leste/PR 415, em Piraquara/PR, seguir em direção ao centro da cidade de Piraquara (cerca de 2,5 km). Passando a Prefeitura, virar a direita no posto Ipiranga, seguir pela rua Maria Carolina Wilk até o final (cerca de 500 metros). Virar a direita, na rua Nova Tirol e seguir por aproximadamente 3,5 km, até chegar no posto de Saúde das Capoeiras dos Dinos. Neste ponto, virar a esquerda na rua Antonio Brudeck e seguir por cinco quilômetros até a antiga estação ferroviária de Roça Nova.

O pacote – visita e mesa gourmet – custa R$ 180 por adulto; crianças de 6 a 10 anos têm desconto de 30%. Só a visitação sai a R$ 60 por pessoa. Para eventos – grupos mínimos de 25 pessoas – as reservas devem ser feitas de quarta a sexta-feira pelo email contato@cavecolinasdepedra.com.br e pelo whattsapp (41) 9 9667-5000.

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