Ney Braga, Jaime Lerner e a sublegenda

Ney Braga e Jaime Lerner na inauguração do Parque Regional do Iguaçu, ao sul de Curitiba/foto: Prefeitura/SMCS/acervo JZ

Nos tempos do regime militar no Brasil, instituído a partir de 1964, com o golpe que derrubou o presidente João Goulart, os partidos tradicionais foram extintos e, para substitui-los, criados apenas dois: Aliança Renovadora Nacional (Arena), de situação, e Movimento Democrático Brasileiro (MDB), de oposição, ou, como definiam alguns, ‘oposição consentida’.

Em 1977, através de decreto, o governo criou o instituto da sublegenda para acomodar as correntes divergentes no âmbito dos dois partidos. No fundo, para garantir a vitória da Arena.

Válida apenas para eleições majoritárias – senador e prefeitos de cidades do interior (nas capitais, os prefeitos eram nomeados) – a sublegenda criou espécies de subpartidos: havia a Arena 1, Arena 2 e Arena 3, e também o MDB 1, 2 e 3. No final, valia a soma dos votos dados a cada sublegenda e o candidato mais votado era o eleito.

No seu segundo mandato como governador do Paraná (1979-1982), Ney Braga nomeou o arquiteto Jaime Lerner para a Prefeitura de Curitiba, depois de aprovação do nome dele pela Assembleia Legislativa. Lerner havia revolucionado o planejamento urbano de Curitiba em sua primeira gestão (1971-1975), também nomeado.

Foi o início de um ciclo de transformações na capital paranaense, com a criação do sistema de ônibus expresso, dos grandes parques, do primeiro calçadão, do resgate da memória e de avanços na área cultural. Curitiba passou a ser realmente inserida no mapa mundi.

Com essa bagagem, Lerner iniciou um novo período administrativo, consolidando as conquistas da primeira gestão.  E criou um valioso instrumento em benefício da população: a tarifa social do transporte coletivo, pela qual linhas mais rentáveis, por serem mais curtas, subsidiavam as deficitárias, na grande maioria utilizada pela população de menor poder aquisitivo.

Como as tratativas das restabelecidas eleições diretas para governador já estavam em curso, e com sua popularidade crescente, Jaime Lerner foi lembrado para concorrer ao governo do estado. Só que o candidato ‘in pectoris’ do governador era o engenheiro Saul Raiz, que havia sido prefeito de Curitiba entre 1975 e 1979 e era secretário estadual de Desenvolvimento Urbano.

A sublegenda, que até então era cogitada também para a eleição de governador, poderia ser uma alternativa para Lerner.

Em determinado dia, despachando no Palácio Iguaçu, Lerner notou que o governador estava bastante gripado e procurava um lenço para assoar o nariz. Como o prefeito sempre carregava dois nos bolsos – em função de uma rinite crônica – ofereceu um, sem uso naturalmente, ao governador, que aceitou.

Em seguida, Ney Braga começou a remexer as gavetas em busca de algo. E disse que, sempre que ganhava alguma coisa de alguém, gostava de retribuir na hora. Mas que não havia encontrado nada para agradecer.

Lerner, então, com um meio sorriso, arriscou timidamente: “Não se preocupe, governador. Aceito uma sublegenda”.

Saul Raiz saiu como candidato único da situação, mas o eleito foi José Richa, que era senador e tinha sido prefeito de Londrina.

 

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