Ônibus, sempre o vilão

1981: prefeitos com Aureliano Chaves (ao centro); à sua direita, Jaime Lerner; ao fundo, Fernando Collor, cabeludo e calado

A questão do transporte coletivo sempre foi alvo de polêmica. E cada reajuste corresponde sempre a uma reação irada da população, até que o tempo passe e todos se acostumem com a nova tarifa. Em 2013, o aumento de 20 centavos no preço da passagem, em São Paulo, desencadeou uma onda de protestos por todo o país. Na verdade, os 20 centavos foram apenas um pretexto para que o povo se revoltasse. Havia outros mais importantes, que estavam entalados.

Com a pandemia do coronavirus e a fatal migração do passageiro transporte coletivo para o individual, diante o temor do contágio do vírus, quem chiou foram as empresas de ônibus. Prefeituras mais abonadas anunciaram socorro àqueles empresários nem sempre bem vistos pela população. Prefeitos foram criticados. Além do mais, o ano eleitoral é um bom motivo para atazanar o forte concorrente à reeleição.

Agora, fala-se num robusto repasse de R$ 4 bilhões por parte da União ao transporte coletivo de cidades com mais de 200 mil habitantes. A matéria já foi aprovada na Câmara dos Deputados e vai à apreciação do Senado Federal.

Muitos argumentam contra o que chamam de protecionismo e outros segmentos clamam pelo mesmo tratamento.

No passado, o grande vilão do aumento das tarifas foi o óleo diesel, cujo preço era reajustado seguidamente em razão dos índices estratosféricos da inflação.

UM ENCONTRO NO PASSADO

Em agosto de 1981, o prefeito de Curitiba Jaime Lerner, que cumpria seu segundo mandato, liderou um movimento nacional para a retirada de tributos sobre o diesel, como forma de brecar a constante majoração das tarifas de ônibus.

E conseguiu a adesão de grande parte dos prefeitos das capitais.

Uma audiência foi marcada em Brasília com o presidente João Figueiredo, dia 17 de agosto, mas quem recebeu a comitiva foi o chefe da Casa Civil, João Leitão de Abreu, que havia há pouco substituído no cargo o poderoso Golbery do Couto e Silva.

Num segundo momento, os prefeitos foram recebidos pelo vice-presidente da República, Aureliano Chaves, que se mostrou muito mais simpático e receptivo do que Leitão de Abreu.

Além de Jaime Lerner, desembarcaram em Brasília para a delicada missão os prefeitos de: Belo Horizonte, Maurício Teixeira Campos; Campo Grande, Levy Dias; Florianópolis, Francisco de Assis Cordeiro; Fortaleza, Lúcio Gonçalo de Alcântara: Goiânia, Índio do Brasil Astiaga Lima: Maceió, Fernando Collor de Mello; Natal, José Agripino Maia: Rio Branco, Fernando Inácio dos Santos; Salvador, Mário de Mello Kertesz; além do secretário de Planejamento de João Pessoa, Waldeci Barbosa, e do secretário dos Serviços Públicos do Distrito Federal, José Geraldo Maciel, que já estava por lá.

O documento entregue ao Governo Federal foi também firmado pelos prefeitos de Porto Alegre, Belém, São Luís, Manaus, Aracaju e Cuiabá e pelo presidente da Companhia Municipal de Transporte Coletivo de São Paulo.

O pedido deu em nada. Figueiredo, que encerrava o ciclo dos presidentes militares, não tomou providência alguma. Foi sucedido por José Sarney – em razão da morte de Tancredo Naves, que havia sido eleito pela via indireta -, em cujo governo a inflação disparou e também nada foi feito.

Daqueles prefeitos, cinco viraram governadores: Jaime Lerner, Mário Kertesz, Lúcio Alcântara, José Agripino Maia e Fernando Collor de Mello.

Detalhe: nos dois encontros, Collor entrou quieto e saiu calado. Até nas fotos se posicionou em segundo plano ou em plano discreto.

Ninguém imaginava que, poucos anos depois, seria ele o presidente da República e muito menos que seria defenestrado na metade do mandato, acusado de corrupção.

E que também nada fez para aliviar o bolso do trabalhador com relação à passagem do ônibus.

E la nave vá…

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