O prefeito Raul

Raul de Azevedo Macedo, entre os filhos Raul e Cássio/foto: Acervo da família

O calendário histórico do Paraná registra, no mês de março, dois fatos de relevância: a elevação de Curitiba à condição de Vila – Vila de Nossa Senhora da Luz dos Pinhais – com a criação da Câmara de Vereadores, em 29 de março de 1693, há 328 anos; e a inauguração oficial do Porto de Paranaguá, em 17 de março de 1935, há 86.

Ambos, a cidade e o porto, já existiam antes dessas datas. Curitiba, por exemplo, inaugurou o Pelourinho, símbolo da Justiça, em 1668, mas há notícias da povoação desde 1654. Já o porto existia, embora de forma rudimentar, desde os tempos do Império. Mas o que vale são as datas consagradas oficialmente, até decisão em contrário.

Para registro da história, dois administradores do Porto de Paranaguá foram prefeitos de Curitiba: os engenheiros Raul de Azevedo Macedo e Ivo Arzua Pereira. O primeiro, durante nove anos – entre 1937 e 1946 (foi o segundo diretor, hoje chamado de superintendente); o outro, por um ano e meio, de janeiro de 1953 a julho de 1954.

Arzua foi um prefeito eleito, em 1962, e cumpriu mandato integral até 1966, estendido até março de 1967, por nomeação do então governador Paulo Pimentel, até ser empossado ministro da Agricultura na presidência do general Arthur da Costa e Silva. Falarei sobre ele em outra oportunidade.

Macedo foi um prefeito nomeado, como tantos outros que Curitiba teve entre 1912 e 1954, quando a redemocratização do País devolveu aos seus cidadãos o direito de escolher seus governantes nas esferas federal, estadual e municipal – até o golpe de 1964. Vamos falar dele, menos conhecido, mas não menos importante na vida político-administrativa do Paraná.

NOVE ANOS NO PORTO

Raul de Azevedo Macedo, filho de João Ribeiro de Macedo e de Anna Maria Azevedo Macedo, nasceu em 30 de julho de 1891, em Campo Largo (PR). Diplomou-se engenheiro em 1918, na primeira turma da Universidade do Paraná. Casou-se no ano seguinte com Damazina Corrêa de Bittencourt e teve três filhos: Dirce, Cássio e Raul.

Depois de trabalhar por conta própria, foi nomeado engenheiro da Secretaria de Viação e Obras Públicas, a mesma da qual seria titular três vezes, passando por uma série de cargos e chefiar a 2ª Residência do Departamento de Obras e Viação (atual DER) em Ponta Grossa.

Nomeado superintendente do Porto de Paranaguá, em 13/2/1937, pelo secretário Ângelo Ferrario Lopes, da Fazenda e Obras Públicas do governo do interventor Manoel Ribas, ficou nove anos no cargo, até 21/1/1946, em pleno período da Segunda Guerra Mundial. Foi então designado diretor do Departamento de Edificações do Estado, na estrutura da recém-criada Secretaria de Viação e Obras Públicas.

Na Administração do Porto, entre outras obras, ampliou o cais acostável, construiu quatro armazéns, projetou o novo cais de inflamáveis do Rocio, estendeu a linha férrea e edificou as vilas da Madeira e Guarani para operários no bairro do Rocio, além de estabelecer normas de atracação e desenvolver um programa de modernização administrativa e ampliação do cais em 500 metros.

De volta a Curitiba, em 1946, foi para a direção do Departamento de Edificações e Obras Especiais (DEOE), onde o interventor estadual – tenente-coronel Mário Gomes da Silva, homem de confiança do presidente recém-eleito, marechal Eurico Gaspar Dutra, e nomeado para cumprir o período de transição ditado pela Constituição de 1946 – foi buscá-lo para ser prefeito de Curitiba.

A LENDA DAS RUÍNAS

Raul Azevedo Macedo comandou a Prefeitura da capital paranaense durante dois meses e meio – de 29 de outubro de 1946 a 14 de janeiro de 1947, justamente no período do governo Mário Gomes (empossado em 7 de outubro e exonerado em 2 de fevereiro do ano seguinte, com a posse do governador eleito Moysés Wille Lupion de Tróia).

Naturalmente, em sua curta gestão na Prefeitura, não teve tempo de executar muitas obras, mas deu atenção aos bairros e mandou remover o canteiro central da rua Marechal Floriano Peixoto, de modo a escoar melhor o tráfego.

O filho Cássio cita um fato do tempo do prefeito Raul, registrado no Boletim Informativo nº 38 da Casa Romário Martins/Fundação Cultural de Curitiba:

“O Palácio do Governo situava-se no Alto de São Francisco, em frente a área meio abandonada onde existem ainda as ruínas da capela de São Francisco de Paula, de 1808. Convidado a dirigir-se à sacada do Palácio (onde hoje está o Museu Paranaense) pelo interventor Mário Gomes da Silva, meu pai foi interrogado se era supersticioso. Ante sua surpresa, explicou-lhe o interventor que gostaria de ver urbanizada a praça das ruínas, porém, antes de expedir determinação neste sentido, quis consultar o prefeito da Capital pela lenda existente, que rezava morte certa para quem ousasse tocar naquelas pedras históricas.

“Meu pai respondeu que não era, e procedeu ao ajardinamento daquele alto. Não faltou quem o aconselhasse a não tocar naqueles sítios, todos encorajados a pensar assim pela morte repentina que acometeu o prefeito anterior logo que manifestou intenção de arrumar a atual praça João Cândido. O beneficiado foi o povo de Curitiba”.

HERDEIRO DO FILHO

Depois de seu curto tempo na Prefeitura, Raul de Azevedo Macedo voltou ao DEOE, acumulando as funções com a de membro da Comissão da Estrada de Ferro Central do Paraná. Em julho de 1950, foi nomeado secretário de Viação e Obras Públicas, cargo ao qual voltaria mais duas vezes, em maio de 1955 e julho de 1958, desta vez para substituir o filho Cássio.

Este é um episódio interessante, contado pelo filho de Raul, no livro “Cássio Bittencourt Macedo – Um construtor de caminhos”, que escrevi em 2012:

“Cássio Macedo era um engenheiro, um técnico, não tinha militância política, mas, a convite do então coronel Luiz Carlos Pereira Tourinho, quando este dirigia o DER, era filiado ao PSP (Partido Social Progressista), desde os tempos de Londrina. Tourinho era o presidente regional do PSP, cujo comando nacional era do ex-governador de São Paulo, Ademar de Barros, que mais tarde voltaria ao cargo e seria também candidato à Presidência da República, derrotado, como o marechal Lott, por Jânio Quadros.

“Em meados de 1958, o PSP rompeu com o governador Moysés Lupion, que era do PSD (Partido Social Democrático). Cássio, então, apresentou seu pedido de demissão. Lupion, que gostava muito do seu trabalho, ficou indeciso, mas era necessário cumprir os rituais político-partidários. Aceitou, mas com uma única condição: que o substituto de Cássio fosse o seu pai, Raul de Azevedo Macedo, também engenheiro e que já tinha sido titular da SVOP, diretor do Porto de Paranaguá e prefeito de Curitiba.

“Aposentado, Raul Macedo estava em Guaratuba, onde tinha casa. Lupion mandou Cássio em seu próprio carro oficial buscá-lo. Encontrou o pai consertando o telhado. O homem achou que era uma brincadeira do filho e só se convenceu quando viu o carro do Palácio do Governo e o motorista, que já conhecia. Assumiu dias depois e, na posse, em tom humorado, comentou que ‘negócio de pai para filho é bom, mas de filho para pai, nem sempre’. E pediu que Cássio o auxiliasse na missão, assumindo a direção do Departamento de Edificações e Obras Especiais da SVOP”.

Depois de mais de 35 anos dedicados à vida pública, Raul Macedo organizou com o filho Raul e o genro Jayme Loyola Junior uma empresa de engenharia. Morreu em Curitiba, em 6 de abril de 1980, um domingo de Páscoa.

O engenheiro Raul Azevedo Macedo foi homenageado em 1983 pelo Governo do Paraná, que batizou com seu nome a rodovia PR-510, entre Campo Largo e Bateias, através do Decreto nº 6.156, assinado em 22 de fevereiro daquele ano pelo governador José Hosken de Novais e pelo secretário dos Transportes, Osires Stenghel Guimarães.

 

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